24 fevereiro, 2012

A ROSA DE TREZE PÉTALAS – PARTE 1



O mundo físico onde vivemos, o universo que nos rodeia, observados objetivamente, são apenas uma parte de um sistema de mundos de uma vastidão inimaginável.



A maioria desses mundos são espirituais em sua essência; são de uma ordem diferente do nosso mundo conhecido.



O que não significa necessariamente que existam em algum outro lugar, mas que existem em dimensões diferentes do ser.



Mais ainda, os diversos mundos interpenetram-se e interagem de modo tal, que podem ser considerados contrapartidas entre si, cada um refletindo ou projetando-se no de baixo ou no de cima, com todas as modificações, mudanças e inclusive distorções que são resultado dessa interação.



A soma dessa troca infinitamente complexa de influências avançando e retrocedendo entre as diferentes esferas de ação é que abrange o mundo específico da realidade que experimentamos na nossa vida diária.



Ao falar de mundos superiores ou inferiores, não tenho a intenção de descrever uma relação física real; porque no campo de ação do espiritual não há tal divisão, e as palavras "alto" e "baixo" referem-se somente ao lugar de qualquer mundo particular, na escada da causalidade.



Chamar um mundo de mais alto, significa que ele é mais primário, mais básico em termos de estar mais próximo de uma fonte de influência primordial, enquanto um mundo inferior seria um mundo secundário — em certo sentido, uma cópia.



Porém, a cópia não é apenas uma imitação e sim um sistema completo, com vida própria mais ou menos independente, sua própria variedade de experiências, características e propriedades.



O mundo onde vivemos habitualmente, com tudo o que ele engloba, é chamado de "mundo da ação"; e ele inclui o mundo da nossa apreensão sensual e não sensual. Mas este mundo da ação em si mesmo não é tudo da mesma essência e da mesma qualidade.



A parte inferior do mundo da ação é o que se conhece como o "mundo da natureza física", e dos processos mais ou menos mecânicos — ou seja, o mundo onde a lei natural prevalece; acima deste mundo de natureza física há outra parte do mesmo mundo, que podemos chamar de "mundo da ação espiritual".



O que é comum a esses dois campos de ação do mundo da ação é o homem, a criatura humana situada de tal modo entre eles, que participa de ambos.



Formando parte do sistema físico do universo, o homem está subordinado às leis físicas, químicas e biológicas da natureza, enquanto que do ponto de vista de sua consciência, mesmo quando esta consciência está totalmente ocupada com assuntos de uma ordem inferior, o homem pertence ao mundo espiritual, o mundo das idéias. Com certeza, essas idéias do mundo da ação estão quase completamente ligadas ao mundo material, crescendo dele e avançando, porém nunca saindo dele realmente; e isto é tão verdadeiro para as alturas da filosofia de maior alcance e mais abrangente, quanto para os processos do pensamento da pessoa ignorante, o selvagem primitivo, ou a criança.



Portanto, todo aspecto da existência humana é composto de matéria e espírito.



E ao mesmo tempo, no mundo da ação, o espiritual está subordinado ao material, de acordo com o fato que as leis da natureza determinam, a face e forma de todas as coisas, e servem como pontos focais para todos os processos.



Neste mundo, o espírito pode aparecer e desempenhar a sua função somente sobre a base sólida dos funcionamentos do que chamamos as "forças da natureza".



Em outras palavras, não importando o quanto ele possa ser abstrato ou estar divorciado da assim chamada realidade, o pensamento continua pertencendo ao mundo da ação.



No entanto, o mundo da ação é apenas um mundo num sistema geral de quatro dimensões fundamentais do ser, Ou quatro mundos diferentes, cada um com seu próprio cosmos de essências variadas.



Esses quatro mundos foram chamados, na ordem do superior ao inferior, "emanação", "criação", "formação" e "ação".



Assim, o mundo diretamente acima de nós é o mundo da formação.



Para entender a diferença, primeiro precisamos compreender alguns fatores comuns aos quatro mundos.



Esses fatores eram conhecidos tradicionalmente como "mundo", "ano" e "alma"; hoje em dia, os chamaríamos "espaço", "tempo" e "si mesmo" (experiência do próprio ser).



Cada mundo é diferenciado dos outros pela maneira como esses três fatores de manifestam nele.



Por exemplo, no nosso mundo, o lugar físico é um elemento externo necessário para a existência das coisas; é o fundo contra o qual todos os objetos se deslocam e todas as criaturas funcionam.



Nos mundos superiores, e também no mundo da ação espiritual, o que é análogo ao espaço no mundo da ação física é chamado de "mansão".



É a estrutura dentro da qual diversas formas e seres convergem e se relacionam. Talvez possamos compará-lo com esses sistemas completos — conhecidos na matemática como "grupos" ou "campos" — em cada um dos quais todas as partes unitárias estão relacionadas de uma maneira definida com as outras partes, e com o todo.



Esses sistemas podem estar habitados ou totalmente cheios, ou podem estar relativamente espalhados ou vazios.



Seja qual for o caso, tal sistema de existências relacionadas constitui um "lugar" no abstrato — uma "mansão" nos mundos superiores.



O tempo também tem um valor diferente nos outros mundos.



No campo de ação da nossa experiência, o tempo é medido pelo movimento de objetos físicos no espaço. O "ano", como ele é chamado abstratamente, constitui o exato processo da mudança; é a passagem de uma coisa para outra, de forma para forma, e também inclui dentro de si o conceito da causalidade, como o que mantém toda a transição de forma para forma, dentro dos limites da lei.



De fato, ao ascender na ordem dos mundos, este sistema de tempo torna-se cada vez mais abstrato e cada vez menos representativo de algo que conhecemos como tempo, no mundo físico; torna-se não mais do que a essência mais pura da mudança, ou até mesmo a possibilidade da mudança potencial.



Por último, o que chamamos de "alma" é, na dimensão física, a totalidade das criaturas vivas funcionando nas dimensões do tempo e do espaço deste mundo. Apesar de serem uma parte essencial deste mundo, elas são diferenciadas do fundo geral pela sua autoconsciência e conhecimento deste mundo.



De modo similar, no mundo superior, as almas são essências conscientes de si mesmas, agindo dentro da estrutura da mansão e do ano do seu mundo.



Pode-se dizer que o mundo da formação seja, em essência, um mundo de sentimento.



É um mundo cuja substância principal, ou tipo de experiência, é a emoção um tipo ou de outro, e no qual tais emoções são os elementos que determinam seus padrões.



Os seres vivos nesse mundo são manifestações conscientes de impulsos particulares — impulsos para realizar um ou outro ato ou reagir de uma ou de outra maneira — ou o poder de levar à prática um incentivo, realizar, cumprir a tendência de uma inclinação ou de uma inspiração.



As criaturas vivas do mundo da formação, os seres que funcionam nele como nós funcionamos no mundo da ação, são chamadas, de modo geral, "anjos".



Um anjo é uma realidade espiritual com seu próprio conteúdo, suas qualidades e seu caráter singular.



O que diferencia um anjo de outro não é a qualidade física da separação espacial, mas a diferença de nível — um estando acima ou abaixo de outro — em relação à causalidade fundamental em termos de alguma diferença na essência.



Ora, como já dissemos, os anjos são seres no mundo que é a esfera de ação da emoção e do sentimento; e como este é o caso, a qualidade substancial de um anjo pode ser um impulso ou uma inclinação — digamos, uma inclinação na direção do amor ou um ataque de medo, ou pena, ou algo similar.



Para expressar uma totalidade maior do ser, algo mais abrangente, podemos referir-nos a "um campo de anjos".



No campo geral do amor, por exemplo, há muitas subdivisões, matizes e graduações virtualmente inumeráveis de sentimentos de ternura.



Não há dois amores iguais em emoção, assim como não há duas idéias iguais. Portanto, toda inclinação ou impulso geral e inclusivo é um campo inteiro, talvez até uma mansão, e não é consistentemente o mesmo em todos os níveis, enquanto que nos seres humanos as emoções mudam e variam segundo as pessoas ou de acordo com as circunstâncias de tempo e lugar, um anjo é totalmente a manifestação de uma essência emocional única.



Portanto, a essência de um anjo é definida pelos limites de uma determinada emoção, em termos de si mesma, como a personalidade e a introversão definem a personalidade de cada pessoa em nosso mundo. No entanto, um anjo não é apenas um fragmento da existência, não fazendo nada mais que manifestar uma emoção; é um ser completo e integro, consciente de si mesmo e do que o rodeia, e capaz de agir e criar e fazer coisas dentro da estrutura do mundo da formação.



A natureza do anjo é ser, até um certo grau, como significa o seu nome em hebraico, um mensageiro, constituir um contato permanente entre o nosso mundo da ação e os mundos superiores.



O anjo é aquele que efetua transferências da abundância vital entre os mundos.



As missões de um anjo vão em duas direções: pode servir de emissário de D-us na direção descendente, para outros anjos e para mundos e criaturas abaixo do mundo da formação; e também pode servir como aquele que leva as coisas de baixo para cima, do nosso mundo para os mundos superiores.



A real diferença entre o ser humano e o anjo não é o fato do homem ter um corpo, porque a comparação essencial é entre a alma humana e o anjo.



A alma do homem é muito complexa, e inclui todo um mundo de diversos elementos existenciais de todos os tipos, enquanto que o anjo é um ser de essência singular, e portanto, num certo sentido, unidimensional.



Outrossim, o homem — devido aos muitos aspectos que encerra, sua capacidade de conter contradições, e seu dom de um poder interior da alma, essa faísca divina que o torna homem — tem a capacidade de distinguir entre uma coisa e outra, especialmente entre o bem e o mal.



É esta capacidade que lhe possibilita subir até grandes alturas, e que também cria a possibilidade do seu fracasso e retrocesso, sendo que nenhuma dessas duas coisas é válida para o anjo.



Do ponto de vista da sua essência, o anjo é eternamente o mesmo; é estático, uma existência imutável, seja ela temporária ou eterna, fixada dentro dos limites rígidos da qualidade dada no exato momento da sua criação.



Entre os muitos milhares de anjos a serem achados nos diversos mundos, estão aqueles que existem desde o começo dos tempos, pois são uma parte inalterada do Ser Etemo e da ordem fixa do universo.



Num certo sentido, anjos constituem os canais da abundância através dos quais a divina graça sobe e desce nos mundos.



Mas também há anjos que estão sendo constantemente recriados, em todos os mundos, e especialmente no mundo da ação onde os pensamentos, os atos e as experiências dão origem a anjos de tipos diferentes.



Toda mitzvah que um homem faz não é apenas um ato de transformação no mundo material; também é um ato espiritual, sagrado em si mesmo. E este aspecto da espiritualidade concentrada e santidade na mitzvah é o componente principal daquilo que se torna um anjo. Em outras palavras, a emoção, a intenção, a santidade essencial do ato combinam-se para tornarem-se a essência da mitzvah, como uma existência em si mesma, como algo que tem realidade objetiva. E esta existência separada da mitzvah, por ser singular e sagrada, cria o anjo, uma nova realidade espiritual que pertence ao mundo da formação. Assim que o ato de fazer uma mitzvah se estende além do seu efeito no mundo material e, pelo poder da santidade espiritual que encerra — santidade em comunhão direta com todos os mundos superiores — causa uma transformação primária e significativa.



Mais precisamente, a pessoa que executa uma mitzvah, que reza ou dirige a sua mente para o Divino, ao fazê-lo cria um anjo, que é uma espécie de tentativa do homem de atingir os mundos superiores.



Esse anjo, no entanto, relacionado em sua essência como o homem que o criou, ainda vive, totalmente, numa dimensão diferente do ser, isto é, no mundo da formação. E é neste mundo da formação que a mitzvah adquire substância.



Este é o processo pelo qual a mensagem específica ou oferenda a D-us, que está intrínseca na mitzvah, adquire substância, sobe e introduz mudanças no sistema dos mundos superiores — especialmente no mundo da formação.



Daqui, por sua vez, elas influenciam os mundos que estão acima.



Portanto, vemos que um ato supremo é efetuado quando o que é feito embaixo se remove de um lugar, tempo e pessoa física, e se torna um anjo.



Pelo contrário, às vezes um anjo é enviado para baixo, de um mundo superior, para um mundo inferior. Porque o que chamamos de missão de anjo pode manifestar-se de várias formas diferentes.



O anjo não pode revelar sua verdadeira natureza ao homem, cujo ser, sentidos, e instrumentos de percepção pertencem somente ao mundo da ação: no mundo da ação, não existem maneiras de captar o anjo.



Ele continua pertencendo a uma dimensão diferente, apesar de ser apreendido de uma ou de outra maneira.



Isto pode ser comparado àquelas frequências de um campo eletromagnético que estão além da gama limitada comumente percebida pelos nossos sentidos. Sabemos que a visão humana assimila somente um pequeno fragmento do espectro; no que diz respeito aos nossos sentidos, o resto dele não existe.



O que é habitualmente invisível é "visto" somente através de instrumentos adequados de transmutação, ou interpretação quando, na linguagem da cabalá, estão vestidos com as roupas ou com os recipientes que possibilitam que nós os apreendamos — como, por exemplo, ondas de rádio ou televisão têm de ser transmitidas através de meios adequados, para serem reveladas aos nossos sentidos.



Do mesmo modo, existem aspectos da realidade do mundo espiritual dos quais estamos somente vagamente conscientes.



Até os animais podem às vezes ser sensíveis, até um grau limitado, à presença dessa essência espiritual.



O burro de Balaam, por exemplo, que "viu" um anjo, logicamente não o viu realmente: provavelmente, o animal teve uma vaga sensação de ser confrontado ou ameaçado por algo.







Os anjos revelaram-se aos seres humanos de uma das duas maneiras seguintes: uma é através da visão do profeta, o vidente, ou o homem santo — ou seja, uma experiência de uma pessoa no nível mais alto; a outra é através de um ato isolado de apreensão por uma pessoa comum repentinamente privilegiada para receber uma revelação de coisas dos níveis superiores.



E mesmo assim, quando essa pessoa ou profeta experimenta de alguma maneira a realidade de um anjo, sua percepção, limitada pelos seus sentidos, permanece ligada a estruturas materiais, e sua linguagem, inevitavelmente, mostra uma tendência para expressões de formas físicas reais ou imaginadas.



Então, quando o profeta tenta descrever ou explicar aos outros sua experiência de ter visto um anjo, a descrição beira o misterioso e o fantástico.



Termos como "criatura alada do céu", ou "olhos da carruagem suprema" podem ser somente uma representação pálida e inadequada da experiência, porque esta experiência pertence a outro campo de ação, com outro sistema de formação de imagens.



Necessariamente, a descrição terá de ser antropomórfica.



Ou quando, como sabemos, o anjo a quem o profeta descreve como tendo a cara de um boi não tem nenhuma cara em absoluto — e certamente não a de um boi — sua essência interior, procurando esclarecimento e reflexão dentro da realidade material, poderá expressar-se de um modo que mostra certa similaridade entre a cara de um anjo e a cara de um boi, como a expressão de uma qualidade espiritual conhecida.



Portanto, todas as visões articuladas da profecia não são nada mais que modos de representar uma realidade espiritual abstrata e informe, no vocabulário da linguagem humana; apesar de que, com toda certeza, também possa haver uma revelação de um anjo de maneira bastante comum, vestido com algum aspecto familiar e manifestada como um fenômeno "normal" da natureza.



A dificuldade é que aquele que vê um anjo desta maneira nem sempre sabe que é uma aparição, que a coluna de fogo ou a imagem de um homem não pertence totalmente ao campo de ação da causa e efeito natural.



Ao mesmo tempo, o anjo — ou seja, a força enviada de um mundo superior — faz a sua aparição e até certa medida age no mundo material, seja estando totalmente sujeito às leis do nosso mundo, ou funcionando numa espécie de vazio entre os mundos nos quais a natureza física não é mais que um tipo de vestimenta para alguma substância superior.



Na Bíblia, Manoá, o pai de Sansão, vê o anjo na imagem de um profeta; porém, ele sente de alguma maneira inexplicável que não é um homem que ele está vendo, que está testemunhando um fenômeno de ordem diferente.



Somente quando o anjo muda de forma completamente e se torna uma coluna de fogo, Manoá reconhece que este ser, esta maravilha que viu e com a qual conversou, não era um homem, não era um profeta, mas um ser de outra dimensão da realidade, quer dizer, um anjo.









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